domingo, 31 de dezembro de 2017

Ter tempo para jogar o que gostamos - Opinião por Micael Sousa

Quem realmente tem paixão por jogos de tabuleiro, em princípio, quer jogar o mais que puder. Digo em princípio porque o gosto por este hobby pode manifestar-se de outros modos. Pessoalmente gosto, tal como jogar, de ver noticiais e reviews de novos jogos, mesmo que não os jogue forçosamente. Interessa-me descobrir todas as mecânicas e novas criações. Interessa-me também pensar e escrever sobre isto, tal como comprova a existência deste blogue. Mas, voltando ao cerne da questão: como não há tempo nem dinheiro para experimentar tudo a alternativa é ler e ver vídeos sobre o assunto, de quem se dedica a isso como atividade principal.

Fonte da imagem: https://www.pinterest.com/pin/206110120419495844/

O facto de não se conseguir experimentar todos os jogos relaciona-se como o fator tempo. Mesmo que não possamos comprar todos os jogos, a partir do momento em que estamos inseridos numa comunidade de gamers, por todos e com o contributo de todos, é possível experimentar a maior parte das principais novidades – sendo que o termo “principal” aqui pode ser muito subjetivo. Ou seja, uma pessoa com vida social ativa e um trabalho que não se relacione com a indústria dos jogos de tabuleiro, vai ter dificuldade em gerir o seu tempo, especialmente quando há muitas outras atividades concorrentes.

Estes dois parágrafos introdutórios para chegar a uma situação que me tem acontecido recorrentemente. Dada a falta de tempo, pois valores mais altos se levantam, dou por mim a ter apenas tempo para jogar à noite, quer entre amigos em casa ou nos nossos encontros semanais do Clube de Boardgamers de Leiria. Mesmo nessas noites dedicadas ao hobby o tempo não abunda. Surge sempre o dilema: vou jogar um jogo mais rápido para poder ter companhia à mesa, arriscando não jogar mais nada nesta noite? Isto só é realmente um problema para quem gosta de jogos um pouco mais demorados, tendencialmente mais pesados – é o meu caso. O dilema é inevitável, porque nem sempre os jogos ditos mais rápidos são assim tão rápidos – o que não faltam são jogadores com paralisia de análise (AP) capazes de duplicar o tempo de jogo normal. Se queremos introduzir novas pessoas ao hobby dificilmente podemos começar por coisas demoradas e supercomplexas, embora isto nem sempre seja verdade. Se queremos maximizar o tempo, especialmente nos encontros semanais públicos, somos tentados a começar logo por uma coisa rápida/média, arriscando depois não jogar mais nada também. Lembro-me de jogos de 1 hora chegarem às 3 horas e mais…

Tudo isto para tentar exorcizar algo que não me larga o pensamento: devo mesmo continuar a ter/jogar jogos mais rápidos e médios que depois me entopem as noites de jogos, impedindo de jogar aquelas coisas que deixam um sentimento gratificante? Tendencialmente são os jogos rápidos/médios que prevalecem na mesa, especialmente nos encontros públicos, onde há a preocupação para que todos joguem sem grandes tempos de espera. Também é chato dizer a alguém que não porque se está à espera de jogar uma coisa “melhor” – sendo o melhor algo muito discutível. Ainda assim tenho vários jogos de 30 a 60 minutos na minha coleção. É obviamente preferível jogar estes jogos a não jogar coisas nenhuma.

Tudo isto obriga a alguma gestão do jogo para além do jogo. Parece um jogo em si próprio, um “metajogo”. Somos então submetidos à gestão entre a flexibilidade de jogar algo simplesmente para gerar uma dinâmica de grupo positiva e reservar aquele tempo necessário para aquilo que individualmente nos dá prazer especial, seja que tipo ou género de jogo for, consoante as preferências pessoais ou do grupo de jogo.

terça-feira, 12 de dezembro de 2017

Regras e mais regras: conseguimos dominar todas? - Opinião por Micael Sousa

Dou por mim a não conseguir jogar toda a minha coleção de jogos, nem sequer a saber jogar alguns dos títulos que estão na prateleira. Isto deve-se a uma clara falta de tempo, pois estar constantemente a jogar está longe de ser uma prioridade. No entanto há outro fator que contribui para isto: as regras.


Uma das coisas que me fascina é descobrir novas mecânicas, experiências de jogo no fundo. Isso envolve, obviamente, lidar com muitas e novas regras de jogos. Quando já passámos da centena de jogos conhecidos as coisas podem começar a ficar baralhadas e confusas. Saber tudo isso de cor, especialmente quando não se levam assim os jogos com tanta regularidade à mesa, torna-se difícil. Duvido que não vos aconteça terem jogados, nos últimos a 2 a 3 anos, duas ou três vezes um jogo em que estão constantemente na dúvida quanto às regras, pois nunca há o tempo necessário para se sedimentarem. Pior ainda quando não jogamos bem o dito jogo, violando, inadvertidamente as regras e piorando a experiência.

Não vejo grande solução para isto. Poderia dizer que há um limite para a quantidade de jogos que podemos assimilar e dominar. Mas é impossível fixar esse tipo de conhecimento quanto a indústria está constantemente a libertar jogos, recorrendo a mais e melhores técnicas de marketing, tal como, supostamente, produzindo jogos cada vez melhores.

Quem costuma lidar com novos públicos a quem divulga e ensina jogos de tabuleiro sabe que a reação de quem está a aprender um jogo novo, perante uma imensidão de regras, costuma ser negativa. Dificilmente alguém percebe todas as regras de um jogo de uma assentada, sendo que alguns podem levar cerca de uma hora a ensinar. Imagine-se se tivéssemos de ir a uma aula de uma hora, sem estudar, e de imediato saber a matérias, por vezes ensinada por quem não a domina totalmente ou não tem preparação para comunicar conteúdos de forma eficaz.

Explicar e ensinar jogos é uma arte num mundo cada vez mais rápido e efémero. Não será fácil encontrar pessoas com disponibilidade para gastar horas da sua vida a ouvir explicações deste género, num contexto em que supostamente participam por diversão. Para além disso existe também outra dimensão social importante, que se relaciona com o modo como determinados grupos sociais lidam com regras. Se na Alemanha e Escandinávia poderá ser mais fácil assimilar e implementar um conjunto de regras fixas, cá para o Sul da Europa a nossa informalidade parece não ajudar muito nisso. Obviamente que isto pode ser extremamente estereotipado e preconceituoso, mas serve apenas de exemplo ilustrativo de como o contexto social e cultural tem também influência na relação com as regras dos jogos.

Remato este texto com uma conclusão inconclusiva: há que dominar as regras dos jogos para deles melhor disfrutar, mas somos sempre impelidos a querer experimentar e conhecer mais, o que não facilita nada conhecer bem as regras de todos os jogos que queremos jogar. Podemos concluir também que há muito mais vida para além das regras, que nos pode levar a pensar indiretamente sobre muitas outras coisas da nossa vida.
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